O ator, diretor e escritor Miguel Falabella emocionou seus seguidores no Facebook ao divulgar um texto de despedida à atriz Marília Pêra no último domingo, 6.
Na mensagem, o ex-apresentador do Vídeo Show sinaliza que parecia pressentir o que viria a acontecer. Na sexta-feira que antecedeu o falecimento da atriz, Miguel conta que não se sentia bem, com um "mal estar por todo o corpo". "Fui para o teatro e não me senti bem no fim do primeiro ato. Cogitou-se até se Cláudio Galvan não deveria fazer o segundo ato em meu lugar, que é o que se faz numa emergência, mas é estranho", relembra.
Ele também não poupa elogios à produtora e também diretora no que diz respeito à sua dedicação e esmero ao dar vida aos mais diversos personagens, comparando-a ao pintor Van Gogh, com sua "singularidade excepcional".
"Assim como Van Gogh escolhia as cores, Marília ia escolhendo emoções e colorindo com elas o texto", compara Miguel, que conheceu sua "mestra" ainda aos 22 anos, quando ela o dirigiu numa montagem da obra 'A Menina e o Vento', da escritora Maria Clara Machado.
"Mais do que conceituar ou nos explicar as intenções da personagem, Marília nos ensinava a amar o teatro. Era dona absoluta do texto, estudava sem parar o texto. Nunca entrei em seu camarim, sem que ela estivesse passando uma ou outra fala".
Um dos trechos mais emocionantes do texto é quando Miguel narra aquela que seria a última apresentação da carioca na série "Pé na Cova", da TV Globo. Foi, de fato, a última vez que ela daria vida à Darlene, uma divorciada casada com seus vícios.
"No seu último dia de gravação, quando ela se despediu de sua memorável Darlene, e foi sendo levada para o camarim em cadeiras de rodas, ovacionada pela técnica e pelo elenco, eu me deixei ficar atrás do cenário, porque percebi no olhar dela, que se estendia até os refletores lá no alto, que aquilo era uma despedida", complementa.
Miguel confirmou, por meio do Facebook, que "Pé na Cova" irá ao ar nesta terça-feira, 8, para "matar as saudades".
Despedida
Marília Pêra morreu no último sábado, 5, no Rio de Janeiro, aos 72 anos, em decorrência de um câncer. No último mês, notícias davam conta que Marília estava com câncer no pulmão. Porém, a família da atriz negou a informação e garantiu que a atriz estava se tratando de um desgaste ósseo na região lombar.
O assunto sobre o estado de saúde da artista veio à tona após a jornalista Hildergard Angel divulgar uma nota em que dizia que a atriz estava sob cuidados extremos. Ainda de acordo com a publicação, uma pequena Unidade de Terapia Intensiva (UTI) com enfermeiros havia sido montada na casa da atriz para lhe oferecer melhor assistência.
E fazia uma analogia entre as pinceladas nervosas e o ritmo inebriante do mestre holandês com a agilidade com que Marília buscava as emoções, cuidadosamente armazenadas e devidamente estudadas. Assim como Van Gogh escolhia as cores, Marília ia escolhendo emoções e colorindo com elas o texto. Enfim, fui para o teatro e não me senti bem no fim do primeiro ato.
Cogitou-se até se Cláudio Galvan não deveria fazer o segundo ato em meu lugar, que é o que se faz numa emergência, mas é estranho. Terminei a peça, fui pra casa, tomei um remédio e me embrulhei nas cobertas. Acordei suado, dolorido, com o telefone tocando. Marília se foi, Cininha me disse chorando./ O mundo para. O quarto está escuro, porque nunca consegui dormir com luz. E penso que preciso vê-la. Preciso me despedir dela./ No avião, vim costurando os pedaços da manta, tentando contar a história.
Eu tinha vinte e dois anos quando conheci Marília Pêra. Era egresso d’O Tablado e ela nos dirigiu numa montagem de A Menina e o Vento da saudosa Maria Clara Machado, no teatro Clara Nunes. Era uma diretora caprichosa, cheia de vontades, e ali já havia a tal singularidade excepcional. Mais do que conceituar ou nos explicar as intenções da personagem, Marília nos ensinava a amar o teatro. A sagração do ofício para ela sempre foi muito importante. Era dona absoluta do texto, estudava sem parar o texto.
Essa foto foi tirada numa de suas últimas gravações. Acabamos de gravar uma cena e ela ficou satisfeita, depois ficamos falando sobre os ataques que ela estava sofrendo por ter abandonado a peça que ela estava ensaiando. Já não importava mais, Marília sofreu vários ataques ao longo de sua carreira. Não somos um povo generoso com o sucesso. A classe a rejeitou no episódio Collor e só seu extraordinário talento fê-la sobreviver ao massacre. Enfim, voltando à foto: Eu peguei o celular e disse: deixa eu tirar uma foto sua! Ela respondeu: Pode tirar. Eu já fiz as pazes com isso tudo.
Já tinha publicado a foto, mas não tinha contado a história. Talvez não fôssemos amigos, como ela gostava de dizer, fazendo charme e fingindo ciúme de outras atrizes, mas em sua última mensagem no WhatsApp, ela diz que me ama do fundo do coração. E eu então? De que maneira mensurar tantas emoções? Você foi o norte de uma geração de atores, Marília! Todos nós seguimos viagem com sua bússola nas mãos, buscando seu fraseado e seu gesto preciso. Eu também te amo. Do fundo do coração. E quer saber? Eu acho que também já fiz as pazes com isso tudo.
AUTOR: O POVO
Eu tinha vinte e dois anos quando conheci Marília Pêra. Era egresso d’O Tablado e ela nos dirigiu numa montagem de A Menina e o Vento da saudosa Maria Clara Machado, no teatro Clara Nunes. Era uma diretora caprichosa, cheia de vontades, e ali já havia a tal singularidade excepcional. Mais do que conceituar ou nos explicar as intenções da personagem, Marília nos ensinava a amar o teatro. A sagração do ofício para ela sempre foi muito importante. Era dona absoluta do texto, estudava sem parar o texto.
Nunca entrei em seu camarim, sem que ela estivesse passando uma ou outra fala. E ensaiávamos nossas cenas com cuidado, aprendendo a respiração um do outro, percebendo o tamanho exato da pausa para que o ritmo não se perdesse e a emoção se mantivesse à tona. Nesse sentido, Marília foi muito mais do que uma colega de trabalho. Foi uma mestra com quem tive o privilégio de ter aulas particulares.
Lembro-me de um dia em que troquei uma fala e ela me corrigiu: como você escreveu fica melhor! Ela costumava dizer que nós não éramos amigos, que o trabalho é que nos juntava. Talvez ela tivesse razão. Nunca me falou sobre a doença e eu entendia o porquê. Não queria que eu a visse como alguém que já não pudesse mais exercer seu ofício. Eu imediatamente comecei a escrever um projeto para ela estrelar depois de Pé na Cova. Percebi que o trabalho talvez a mantivesse viva.
Não foi o bastante. No seu último dia de gravação, quando ela se despediu de sua memorável Darlene, e foi sendo levada para o camarim em cadeiras de rodas, ovacionada pela técnica e pelo elenco, eu me deixei ficar atrás do cenário, porque percebi no olhar dela, que se estendia até os refletores lá no alto, que aquilo era uma despedida. Talvez não fôssemos amigos, mas havia algo muito maior que nos unia: o respeito pelo ofício. Que eu aprendi com ela e com outros mestres que me cruzaram o caminho.
Essa foto foi tirada numa de suas últimas gravações. Acabamos de gravar uma cena e ela ficou satisfeita, depois ficamos falando sobre os ataques que ela estava sofrendo por ter abandonado a peça que ela estava ensaiando. Já não importava mais, Marília sofreu vários ataques ao longo de sua carreira. Não somos um povo generoso com o sucesso. A classe a rejeitou no episódio Collor e só seu extraordinário talento fê-la sobreviver ao massacre. Enfim, voltando à foto: Eu peguei o celular e disse: deixa eu tirar uma foto sua! Ela respondeu: Pode tirar. Eu já fiz as pazes com isso tudo.
Já tinha publicado a foto, mas não tinha contado a história. Talvez não fôssemos amigos, como ela gostava de dizer, fazendo charme e fingindo ciúme de outras atrizes, mas em sua última mensagem no WhatsApp, ela diz que me ama do fundo do coração. E eu então? De que maneira mensurar tantas emoções? Você foi o norte de uma geração de atores, Marília! Todos nós seguimos viagem com sua bússola nas mãos, buscando seu fraseado e seu gesto preciso. Eu também te amo. Do fundo do coração. E quer saber? Eu acho que também já fiz as pazes com isso tudo.
AUTOR: O POVO
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